O lobo e o cordeiro

O Lobo e o Cordeiro

Uma história para dormir sobre a verdade e a injustiça

Era uma vez, num reino distante onde os pinheiros beijavam as nuvens e os riachos cantavam melodias de cristal, uma floresta exuberante e pacífica. Nela, as famílias de animais viviam em relativa harmonia, seguindo as leis antigas da natureza, que prezavam pelo respeito e pela sobrevivência honrada. Havia um riacho, em especial, que era a alma do lugar. Suas águas eram tão límpidas que pareciam feitas de luz líquida, e todos os animais iam até lá para matar a sede e conversar.

Numa manhã radiante, enquanto o orvalho ainda brilhava como diamantes na teia das aranhas, um jovem e meigo cordeiro chamado Belo Balanço decidiu se aventurar sozinho até a margem do riacho. Ele era novo no mundo, cheio de uma curiosidade inocente que o impelia a explorar os arredores da clareira onde sua mãe e o rebanho pastavam.

— Não vá muito longe, meu filho — baliu sua mãe, com um olhar carinhoso, mas preocupado. — Lembre-se de que a floresta, apesar de linda, guarda perigos. A sombra do Lobo Cinzento às vezes paira sobre nós.

Belo Balanço, porém, sentia-se corajoso sob o sol da manhã. Ele saltitou pela trilha, seu casaco branco contrastando com o verde intenso da mata. Ao chegar na beira do rio, inclinou-se para beber as águas frescas e doces que escorriam das montanhas mais altas. Ele mal podia imaginar que, do outro lado do rio, um par de olhos amarelos e famintos o observava fixamente.

Era o Lobo Cinzento, um animal amargurado pela idade e pela fome, que perdera a agilidade para caçar presas mais velhas e espertas. Ao avistar o cordeiro indefeso, uma ideia cruel surgiu em sua mente. Ele não atacaria de imediato; primeiro, justificaria sua ação perante as leis não escritas da floresta.

O diálogo injusto

Com passos silenciosos e ameaçadores, o Lobo atravessou o rio em um ponto raso e posicionou-se a montante do cordeiro, ou seja, na direção de onde a água vinha.

— Como ousa, seu criatura insolente! — rugiu o Lobo, mostrando seus dentes afiados. — Como ousa turvar a água que eu estou bebendo? Sua ousadia tem a cor do desrespeito!

O coração de Belo Balanço gelou de medo. Ele ergueu a cabecinha e, com uma voz trêmula mas educada, respondeu:

— Oh, senhor Lobo, peço mil perdões, mas isso é um engano. Como poderia eu, que estou bebendo aqui a jusante — na direção para onde a água flui —, turvar a água que vem de cima, de onde o senhor está? A correnteza leva tudo para baixo, nunca para cima. A água que molha meus lábios passou por si primeiro.

A lógica do Cordeiro era tão pura e cristalina quanto as águas do riacho. O Lobo, surpreendido pela sagacidade do pequeno animal, sentiu um acesso de raiva. Sua primeira desculpa havia sido demolida. Ele rosnou, avançou alguns passos e inventou uma nova acusação, mais absurda ainda.

— Não me venha com argumentos espertos! — vociferou ele. — Mas não importa. Se não foi hoje, foi no ano passado. Sim, lembro-me perfeitamente! Foi você quem falou mal de mim, espalhando mentiras e boatos pela floresta. Ouvi da própria raposa!

O pequeno cordeiro, agora mais assustado, mas mantendo sua inocência, balançou a cabeça, seus olhos grandes transbordando sinceridade.

— Senhor Lobo, isso é impossível. No ano passado, eu nem mesmo havia nascido. Estou na minha primeira primavera. Como poderia ter dito algo sobre o senhor antes mesmo de existir?

A raiva do Lobo transformou-se em uma fúria cega. A verdade, exposta de forma tão simples e irrefutável, não tinha lugar em seu plano. Ele não queria justiça; queria uma desculpa para sua crueldade. A fome latejava em seu estômago, e a fraqueza do cordeiro era um convite irresistível. As leis da floresta, que prezavam pela razão e pela verdade, foram pisoteadas em um instante.

— Poupe-me de suas explicações! — rosnou, avançando com seus ditos à mostra. — Se não foi você, foi seu pai ou sua mãe. A culpa é de sua família! E hoje, você será minha refeição.

O desfecho triste

Belo Balanço não teve tempo de reagir. A inocência e a verdade de suas palavras não foram capazes de deter a força bruta e a má-fé. O Lobo Cinzento deu um salto rápido e silencioso, e em um piscar de olhos, a vida do meigo cordeiro foi interrompida. O silêncio que se seguiu na beira do rio era pesado e triste. O sol continuou a brilhar, o riacho a correr, mas a injustiça havia manchado aquele lugar idílico.

A notícia do acontecido se espalhou pela floresta como um vento gélido. Os animais se reuniram, chocados e entristecidos. O Sábio Coruja, que vivia no carvalho mais antigo, foi convidado a falar.

— Esta história — começou ele, com uma voz grave e pesarosa — nos ensina uma lição amarga, mas necessária. Para aqueles que estão determinados a fazer o mal, nenhuma justiça, nenhum argumento lógico, nenhuma verdade será suficiente para detê-los. Eles sempre encontrarão uma desculpa, por mais fraca e irracional que seja, para justificar sua própria maldade.

O Lobo, em sua mente distorcida, acreditava ter “razão”. Ele cegou-se para a verdade porque sua necessidade era maior do que seu caráter. A floresta inteira chorou a perda de Belo Balanço, e sua memória se tornou um símbolo da vulnerabilidade da inocência diante da força cruel.

Porém, a história não terminou em completa escuridão. A mãe do cordeiro, embora devastada pela dor, reuniu forças para contar a história do filho a todos os animais jovens. Ela não queria que eles vivessem com medo, mas sim com sabedoria.

— A verdade de vocês é sua armadura — ela ensinava. — Mas a sabedoria é seu escudo. Conheçam os perigos, evitem os lugares sombrios sozinhos e confiem no poder do rebanho, da família. A maldade do lobo não pode apagar a beleza que Belo Balanço viu no mundo em seu curto tempo entre nós.

E assim, a história de “O Lobo e o Cordeiro” foi passada de geração em geração. Tornou-se uma canção de ninar triste, mas importante, cantada pelas mães ovelhas para seus filhotes. Era uma melodia que falava de perda, sim, mas também de coragem, de perseverança e da importância de sempre defender a verdade, mesmo quando ela parece não ser ouvida.

Enquanto as estrelas cintilavam sobre a floresta tranquila, os animais se aconchegavam em suas tocas, lembrando que, mesmo na escuridão, a memória da inocência e as lições da sabedoria continuam a brilhar, guiando todos os corações bons em direção a um amanhã mais esperançoso.

Que esta história para dormir nos lembre que a bondade e a verdade são valores eternos, e que a sabedoria está em saber onde e com quem compartilhar a nossa inocência.

Para resumir…

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