Era uma vez, em um bosque repleto de vida, onde os raios de sol dançavam entre as folhas das árvores, uma cigarra que era a própria essência do verão. Enquanto a estação mais quente do ano estendia seus dias dourados, a cigarra dedicava-se ao que sabia fazer de melhor: cantar. Sua voz, melodiosa e despreocupada, ecoava por todos os cantos, celebrando o calor, a abundância e a beleza do presente.
Do outro lado do mesmo bosque, em um movimento frenético e organizado, uma colônia de formigas trabalhava incansavelmente. Sob o comando de sua sábia Rainha, cada formiguinha carregava sobre suas costas folhas, grãos e sementes, armazenando tudo em seu formigueiro com um propósito claro: preparar-se para o inverno.
O encontro no bosque ensolarado
Certa tarde, enquanto a cigarra saltitava de galho em galho, esbarrou em uma pequena formiga que lutava para puxar uma folha muitas vezes maior que ela. A cigarra, curiosa e alegre, interrompeu sua canção para perguntar:
– Ei, formiguinha! Para que todo esse trabalho? O verão foi feito para aproveitarmos! Olhe só este sol, sinta esta brisa! A vida é para ser cantada e dançada, não para ser carregada!
A formiga, sem parar seu movimento, respondeu com voz séria, porém educada:
– Não, cigarra. Nós, formigas, não temos tempo para tanta diversão. Enquanto o sol brilha, é nosso dever armazenar comida para os dias frios que estão por vir. O inverno não tarda a chegar.
A cigarra riu, uma risada leve e musical.
– O inverno? Mas ele está a uma eternidade de distância! Você está perdendo a alegria do agora!
E, sacudindo suas asas, a cigarra partiu, retomando sua serenata sem um cuidado no mundo. Para ela, a fome era uma preocupação distante; o bosque era sua despensa, sempre pronta para oferecer uma folha suculenta ou um orvalho matinal.
A tentação e a advertência da rainha
Dias se passaram, e a cigarra, em uma de suas andanças, cruzou novamente com a mesma formiguinha, agora arrastando uma semente pesada. A visão daquela trabalhadora incansável encheu a cigarra de uma pena genuína.
– Formiguinha, você não cansa? – exclamou a cigarra. – Deixe esse trabalho para as outras! A vida é curta demais para ser só trabalho. Venha! Vamos cantar juntas! Vamos dançar sob o sol! Aproveite um pouco da minha liberdade!
A sugestão, feita com tanto entusiasmo, era como um feitiço sedutor. A formiguinha, pela primeira vez, parou completamente. Ela observou a cigarra, tão leve e feliz, e sentiu um desejo profundo de experimentar aquela sensação. O rigor da disciplina cedeu lugar à curiosidade. Ela largou a semente e, por uma tarde inteira, juntou-se à cigarra. Riram, dançaram e cantaram, e a formiguinha sentiu-se maravilhosamente viva.
No entanto, a festa teve um fim abrupto. A Rainha das Formigas, em sua ronda de inspeção, testemunhou a cena. Seu olhar era firme e severo.
– Formiguinha! – disse a Rainha, com uma voz que não admitia contestação. – A diversão tem seu lugar, mas o dever chama. Nossa sobrevivência depende do trabalho de cada uma. Volte ao seu posto. A vidinha boa acabou.
Em seguida, a Rainha voltou-se para a cigarra, que observava tudo com um sorriso irônico.
– Quanto a você, cigarra – advertiu a Rainha –, se não mudar sua vida, no inverno há de se arrepender amargamente. Você vai conhecer a fome e o frio, e não haverá cantoria que afaste a desgraça.
A cigarra, porém, não se abalou. Fez uma reverência exagerada, quase cômica, e retrucou:
– Hum! O inverno ainda está tão longe, minha cara Rainha! Por que se preocupar com uma nuvem negra em um céu tão azul?
Para a cigarra, o “hoje” era tudo que importava. Construir um abrigo? Armazenar alimento? Essas eram ideias tediosas que só roubavam a alegria do momento presente.
O inverno chega
O verão, como tudo na vida, chegou ao fim. Os dias ensolarados deram lugar a céus cinzentos; o ar quente transformou-se em um vento cortante, e as primeiras geadas pintaram o bosque de branco. Para a cigarra, a mudança foi uma catástrofe. Suas fontes de alimento desapareceram, e as árvores, outrora palcos de suas performances, agora eram estruturas nuas e gélidas.
Tremendo de frio, com o corpo fraco pela fome, a cigarra desesperou-se. Suas canções foram substituídas por gemidos. Lembrou-se, então, das palavras da Rainha e do abrigo seguro das formigas. Arrastando-se com dificuldade, ela chegou à entrada do formigueiro e bateu com a pouca força que lhe restava.
A porta abriu-se. Era a mesma formiguinha que ela havia convencido a dançar. Ao ver a cigarra naquela situação lastimável, quase congelada, a formiga não hesitou. Puxou-a para dentro do formigueiro, quente e aconchegante. Envolveu-a em um agasalho feito de pétalas secas e serviu-lhe uma tigela de sopa quente e nutritiva, feita com os grãos que haviam sido armazenados durante o verão.
Uma nova harmonia
Enquanto a cigarra se recuperava, reconhecida e envergonhada, a Rainha das Formigas apareceu. O olhar dela já não era de reprovação, mas de sabedoria.
– Você viu, cigarra? – disse a Rainha. – O mundo precisa de beleza e alegria, tanto quanto precisa de trabalho e planejamento. Você passou fome porque só pensou no hoje. Nós sobrevivemos porque pensamos no amanhã.
A Rainha então fez uma proposta:
– No mundo das formigas, todos trabalham. Se quiser ficar conosco até a primavera, terá de cumprir o seu dever. E o seu dever é o que você faz de melhor: toque e cante para nós. Sua música aquecerá nossos corações durante o longo inverno.
A cigarra, com os olhos cheios de lágrimas de gratidão, aceitou. E assim, naquele inverno, o formigueiro não foi apenas um local de trabalho e estoques. Foi também um lar cheio de música. A cigarra cantava melodias que lembravam o verão, e as formigas, ao escutá-la, sentiam seu labor se tornar mais leve.
Foi o inverno mais feliz da vida da cigarra e, quem sabe, também das formigas. Elas aprenderam que a vida em sua plenitude é um equilíbrio: é preciso ser formiga para garantir o amanhã, mas também é preciso ser cigarra, de vez em quando, para celebrar a beleza do hoje.
Moral da história:
A verdadeira sabedoria não está em ser apenas cigarra ou apenas formiga, mas em encontrar um ponto de equilíbrio. É preciso ser “formiga” o suficiente para garantir segurança e um amanhã, mas também ser “cigarra” o suficiente para apreciar o hoje e enriquecer o mundo com seus dons únicos.








